sexta-feira, 27 de novembro de 2009

1976 - GALERIA "O PRIMEIRO DE JANEIRO"

OLHA!:


Quem te disse, amigo, que «arte» era coisa lá de cima?

Que quadros e outras coisas eram apolíticos?

Que a nossa obrigação era jogar com uns quantos o jogo da masturbação intelectual, para gozo zoológico em galerias e outros recantos inacessíveis e silenciosos?

Quem te disse que o nosso dever era manter-vos afastados – ou fazer-vos afastar – do quotidiano, em vez de irmos convosco mergulhar nas raízes da terra, sujar as mãos nas vísceras-intestinais que somos: homens comendo-nos?

Não amigo!

A História é a história da luta de classes – queiras ou não – as torres de marfim apodreceram ou estão rachadas, intervir é estar vivo, fazer a «coisa artística» é tomar partido de um dos lados – e se o povo se bate lá fora em cada posto, em cada rua, como podemos nós, senão vigarizando (mentindo) dizer que não sabemos!?

Enfim, as pessoas a quem queria dizer coisas, não vão vir cá – mas é preciso bater-se em todos os terrenos.

E a ti – se vinhas ouvir o cantar das ninfas, a poética do estar de costas, esperavas o «deleite» do mel e das fragrâncias florais, então, meu caro, não tenho nada para ti, homem ingénuo, homem ridículo. Absolutamente nada!

E a ti – que esperavas a subserviência aos teus esquemas e valores, a que estás habituado nos lambe-botas e oportunistas que fazem o teu jogo burguês, directa ou encapotadamente, tenho o meu gesto militante, o meu grito – este soco que tens de sentir no fundo, impotente para dizer não!

Mas a ti – que sentes o pulsar do dia e do espaço (e talvez tenhas entrado por acaso) – a ti amigo, estendo francamente a minha mão de camarada.


Porto – Maio – 1976


(Texto do cartaz/nota exposto na galeria do Primeiro de Janeiro e que serviu de pretexto para o fecho da expo – pela direcção – vinte e quatro horas após a abertura)

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