Fazem
Bocências a fineza de desculpar a mal alinhavada prosa - fossem outros
os tempos
e havia de esmerar o florilégio, aguçar a pena e o engenho (que pou-
co
seja, o labor ajuda).
Só
que
do fundo da gruta de eremita ou cela de
monge medieval ou espaço de solidão
sòmente,
olho os escombros da civilização
e pesam-me nos ombros (os meus anos, as minhas desilusões? ) as
vozes de todos os mortos pelos direitos dos
outros, a felicidade dos outros - que
silênciam
os canalhas - os séculos de libertação desfeitos numa década para que a
escravatura
tecnológica do fascismo financeiro se instale (provavelmente sem que
sequer
saiba no fundo bem para quê, talvez só porque sim, porque pode).
À
volta, os senhores das comissões liquidatárias (dos países, da liberdade, da
huma-
nidade),
nem governantes, nem imbecis, nem,
apenas
pobres de espírito catando as migalhas que lhes atiram antes de os despeja-
rem
no caixote do lixo onde afinal sempre estiveram sem saber, quando acabarem
o
serviço que lhes encomendaram
nem traidores, nem ao menos
salafrários, apenas cria-
dos
nem sabendo ao certo de quem.
À
volta as vozes do dono dos media, os defensores dos direitos, as
associações de
caridade,
as fundações, a democrática escolha entre A e A, a
- que o resto do alfabeto se refere a
terroristas, anar-
quistas,
sindicalistas, desgraçados, desempregados, gentuça individada, jovens sem
futuro,
velhos sem presente, pretos, amarelos,
azuis às riscas ( bons para servir de
alvo
às bombas dos drones da civilização ). E bolas para a educação, a saúde,
a dig-
nidade.
(Já, sei: “toda
a palafrenária do populismo”.) - mesmo assim:
À
volta…
Era
uma vez um país que não era, numa europa que não era, num mundo que não
era.
Ganiam os cães, corriam os polícias apetecendo-lhe estar em casa mas baten-
do
na populaça, que era o que sabiam e lhes tinham mandado fazer. As prostitutas
batiam
a estrada, a banca engordava, os pobres alimentavam os ricos como lhes
competia,
o exército levava a paz à força às
terras do fim do mundo, que nem sa-
biam
onde ficavam…
eram todos felizes e comiam perdizes
Até
que.
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Enfim,
insignificâncias só significantes na situação do olhar.
A
verdade é que não sou eremita sonhando paraísos, nem monge medieval cantando
hossanas
e pintando iluminuras, não tenho uma gruta ou cela de convento de muros
seguros
onde me abrigar dos ventos de iniquidade que sopram.
Talvez nem a so-
lidão
de onde olhe estes escombros da civilização, nem afinal o peso dos anos ou as
desilusões:
mas nos ombros
pesam-me, isso sim, as vozes de todos os mortos
pelos
direitos dos outros, a felicidade dos outros e que a canalha quer silenciar.
E
si-
lenciaria
se pudesse para que todos ficassem nivelados à altura da sua (quê?)
O
problema é que no fundo, como se diz
pelas ruas, 99% são 99%, as palavras, as
tintas,
as músicas, não são todas dos bobos da côrte.
E há
uma coisa a que se chama REVOLTA.